terça-feira, 1 de agosto de 2017

Aqueles que cavam

           A noite estava calma, tal como o ambiente do bar. Para além de alguns bêbados inanimados em cima de algumas mesas ou do balcão, restavam apenas o barman, três cavalheiros a jogar poker e o seu dealer. Várias já tinham sido as mãos trocadas entre eles, tal como os avultados montes de dinheiro, que agora já tinham visto o mesmo dono mais que uma vez.

            O barman limpava o balcão com desinteresse absoluto ao que se passava, focando-se apenas na monotonia da sua tarefa, não tendo quaisquer problemas em desfazer-se de quaisquer pesos embriagados que o obstruíam. Pesado era o som do embate assim que caíam no chão, mas, ainda assim, incapaz de os acordar, soltando apenas um sonoro ronco.

            O tempo passava, tal como a monotonia, apenas quebrada pelas ocasionais pancadas na mesa, as habituais deixas que o jogo de poker exige, embriagados ressonares e o som de um pano húmido a ser passado por um balcão de madeira gasta e copos de vidro sem remedeio algum.

            As horas passavam, contadas pelos cigarros que o dealer fumava. Ele fixava as cartas e os jogadores com um olhar vazio, baralhando e dando as cartas de forma tão natural e mecânica como se de respirar se tratasse.

            O tempo passava e o dinheiro acumulava-se na mesa, o que significava que se esvaziava no bolso. Quando começou a ficar escaço, o desespero começou a tomar lugar e os ânimos exaltaram-se. Um gesto de batota que se ficou por saber se realmente aconteceu ou não fez com que todos se levantassem e, ora por sorte ou por azar, tomaram os seus revólveres em simultâneo e premiram os gatilhos. Os três caíram mortos.

            O estrondoso espalhafato chamou a atenção do barman e de alguns dos restantes clientes que, ora retomavam o seu estado quase comatoso, ou tentavam sair do bar tal como podiam. O dealer contemplou a cena com o seu olhar vazio, e apagando o seu cigarro na mesa, levantou-se. Tomou a pá imunda que tinha deixado encostada atrás de si, e tomou um dos corpos.

            - Trabalhar a esta hora? – perguntou o barman.

            - É melhor enquanto os corpos estiverem frescos.

            - Não questiono.

            Assim que o dealer se viu diante da porta, ouviu novamente:

            - Pode-se quebrar este ciclo?

            O dealer parou, pousou a pá ao seu lado e respondeu:

            - Há dois tipos de pessoas, as com armas, e as que cavam. As que têm armas só se apercebem do que têm nas mãos quando já é tarde demais. Resta aos que cavam deixar uma mensagem para os que cá ficam. Pode ser quebrado? Não me parece. Haverá sempre alguém com uma arma e alguém para o enterrar… Dá-lhe uma olhadela neles. Eu já volto.

            E saindo do bar, deixou-se levar pelo abraço da escuridão.

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