quarta-feira, 7 de março de 2018

Profundos Desejos


             Todos temos os nossos segredos. Alguns vivem deles, ora colecionando-os, ora expondo-os. O meu maior segredo foi ambicionar saber tudo sobre tudo. Apesar das limitações que o meu cérebro impõe sobre mim, uma vez que a sua capacidade de conter informação é biologicamente limitada, nunca encarei este objectivo como inatingível.

            Para alguns isto pode não parecer um segredo, mas sim um simples sonho ambicioso como tantos outros. A questão é que nem todas as formas de conhecimento são transmitidas abertamente. Algumas, as mais interessantes, estão escondidas de tudo e de todos, e nalguns casos, são tidas como há muito esquecidas.

            Durante os meus anos de estudo, dei por mim a nutrir uma dependência por esta secreta ambição. Tinha que saber mais e mais, custasse o que tivesse que custar. Vasculhei bibliotecas fora de horas, subornei para aceder a registos privados, troquei favores por documentos… tudo para ter a minha sede saciada.

            O problema deste tipo de dependências é que tendem a agravar-se, pelo que História, Psicologia, Medicina, Matemática e as demais ciências, rapidamente deixaram de ter muito para oferecer. Perante a necessidade de algo mais, recorri às artes obscuras. O Oculto, e tudo aquilo que ele implica, tomou toda a minha atenção. Estudei Alquimia e tratei de procurar sintetizar as minhas próprias soluções, os meus próprios elementos. Estudei Tarologia, Cartomancia e toda uma outra série de formas de adivinhar o futuro, meu e dos outros. Mas nada foi capaz de chegar aos calcanhares de quando aprendi a entrar em contacto com outras entidades que habitam neste mesmo plano. Há muito que se pode aprender com quem esteve presente desde o momento da criação… principalmente se se chegar a um acordo.

            Um outro problema das dependências, das obsessões doentias, é que se não tivermos cuidado, elas acabarão por nos consumir. Apesar de tudo o que aprendi, apesar de tudo o que eu já devia saber e tomar como certo, não consegui resistir à tentação de assinar um contrato com alguém que prontamente mo apresentou em troca de todos os segredos que permitem a nossa existência. A essência, o auge daquilo que é o verdadeiro saber… como é que eu poderia recusar? O meu nome reluziu com um brilho vermelho escarlate assim que assinei aquela folha, e prontamente me vi a cumprir o meu maior desejo.

            Mas agora escrevo nestas páginas com uma outra entoação. Há coisas que é melhor não sabermos. Há portas que é melhor não abrir. Neste caso, não foi o que fiz, mas com quem. O contrato pedia muito mais do que eu poderia alguma vez imaginar, algo que fiquei a saber assim que o assinei.

            Escrevo nestas páginas consciente de que é a última coisa que alguma vez farei.

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