A
lógica mais não é que um emaranhado de ténues teias que não só une como envolve
todas as coisas. Existe lógica na ciência, na arte e também na natureza mais
primitiva do próprio ser. Elevando esta ideia para um outro plano, e sem
acrescentar a lógica por detrás de crenças religiosas, podia tudo culminar num
lógico confronto entre a Vida e a Morte, um jogo de xadrez extenso em recursos
e sem pressas no que toca ao tempo. 
            Cada uma move as peças, depositando
na estratégia a sua própria personalidade. A Vida mantém a sua inocência e jovialidade,
executando movimentos belos e delicados, ao passo que a Morte procura castigar
severamente esta ingenuidade, pois não há nada de belo na existência, apenas
dor e sofrimento. Perante estes episódios a Vida procura trazer algum
optimismo, como se houvesse sempre uma luz ao fundo do túnel:
            - Demasiado duro, querida Morte –
diz.
            - É suposto a existência ser dura.
Só assim se pode evoluir como pessoa e consequentemente como ser.
            - Mas há mais para além disso. De
que adianta viver se não se apreciam as mais pequenas coisas que nos são
proporcionadas?
            - Não passam de distracções.
            - Mas não serão necessárias?
            - Um momento de felicidade leva a
uma vida de sofrimento.
            - Sabes muito bem que nem sempre é
assim.
            - Mas não deixa de ser uma
realidade.
            - Uma realidade deturpada por ti.
            - Poderia dizer o mesmo. O que seria
deste mundo se existisses apenas tu? Os humanos viveriam as suas vidas
alegremente, prosperando para além daquilo que o planeta permite e mesmo que
conseguissem expandir-se para outros mundos, tudo não seria mais que adiar o
inevitável. Mais cedo ou mais tarde tornar-te-ias em mim.
            A Viva tomou o seu tempo a digerir
estas palavras, a pensar nos seus movimentos e num bom argumento:
            - Mas… será que é mesmo assim?
            - Sabes bem que é. Se queres parar
de te iludir, fecha os teus olhos e vê as minhas palavras a ganharem forma.
            Ela assim fez. Viu longos anos
prósperos e felizes, com as mais diversas culturas a viver em paz e harmonia,
mas tal como a Morte tinha dito, foi só uma questão de tempo até o desespero
dar luz às primeiras hostilidades, que se transformaram em guerras e culminaram
em caos e destruição.
            - Tens razão – disse ela, deixando
cair uma lágrima no tabuleiro.
            - Sei que tenho, mas também sei que tu
e eu precisamos de existir. Os humanos não percebem o poder que possuem,
desconhecem e nem se preocupam com as consequências das suas acções e estão
totalmente alheios do seu verdadeiro potencial. Preciso de ti para lhes dares
esperança, para lhes dares vontade de se levantarem de manhã e viver a sua
vida, mas tu precisas de mim para que eles não vivam de ilusões.
            - Mas preciso mesmo?
            - Sim, precisas – respondeu a Morte,
sorrindo.
            - Creio que é uma ilusão acreditar
que não formamos nenhum ciclo.
            - Sim, é.
            - E estou contente que assim seja.
            - E eu também.
            Várias calmas e cuidadas jogadas se
seguiram até que:
            - Há quanto tempo é que jogamos este
jogo, querida Morte?
            - Desde o início, querida Vida.
            - E algum dia terá fim? Haverá algum
vencedor?
            A Morte esboçou um estranho sorriso:
            - O fim dos tempos o dirá.
 
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